15 janeiro 2009

Pronto

Tô pronto pra namorar não. Namorar dá muita trabalheira, dá muita despesa. Tem flor, chocolate, presente de dia dos namorados, ovo de páscoa de coração. Além disso, tem muita menininha danada por aí pra eu assossegar com uma só. Muita sopa demais e eu c’um prato só. Tem que ir devagar, uma de cada vez, cuidado pra num queimar boca, nem faz digestão nem espera sobremesa, prepara o próximo caldo. Uma menininha só é pouco pra galã quem vem de lá de longe como eu pra cidade. De lá de lá tinha meia dúzia de gata pingada, tudo mais ou menos prima. De lá de cá, só no bairro aqui e vizinho tá abarrotado, tuda princesa! Pra quê escolher e atravancar, no final das contas? Só se fosse pra casar.

A verdade é que não tô nem pronto pra casar não. Dá muito trabalho, dá muita confusão, dá muito suor no sovaco e pouco suor na virilha. Além de que mulher custa caro, dá prejuízo brabo. Já viu? Tudo tem que estar sempre funcionando, tudo sempre limpo, tudo sempre isso, sempre aquilo. Mulher devia era de ser guarda-noturno, porque não descansa!

Não, não tô pronto. Só de pensar já tô é cansado.

Além disso, tenho muita vida pra viver. Nem é que eu num seja mulherengo não, é só que tem coisa que precisa conhecer... ainda num peguei peito de silicone nem num beijei mulher com brinco de bolinha na boca, vê, tem muita coisa moderna que tenho que conhecer antes de pousar meu jumento. Diz que cá tem até mulher da mais princesa cum sabugão entre as perna. Tem, sim. Gente como eu que vem de lá de longe pra cidade é assim: chega e é tudo novo. Mesmo o que já viu milhão de vez na tevê... é tudo novo de novo. Porque de ao vivo é diferente: a mulher tem cheiro, a comida é quente, a tal da garoa molha.

Pra ter mulher, mais no mais, tem mais é que ter casa. Senão mulher não dá paz. Casa deixa mulher mais quieta, parece que ela até arrespira quando já não tem que pagar mais aluguel nem nada. Mas casa custa um dinheirão mais, tem que dar duro danado. Além de dar duro danado tem que ficar duro de marré... não sobra nem centavo pra cachaça com os menino no Justino. Olha que até que o Justino até fazia fiado pra mim que dou de confiança nele. Mas dever pra ninguém num é bom não. Ainda mais que se a mulher descobre que tá devendo... daí é que a porca torce o rabo e ainda muge por cima. Então a cervejinha tem que ficar pra depois da casa, magina só. Coisa de mulher. Devia de ser guarda-noturno. A mulher, não eu.

Mais por cima, se casa e tem casa, vai acabar tendo é filho. Oras, eu até quero, dia vai dia vem, ter filho, quem é que não quer um meninão com a minha cara, até mesmo com a mesma orelha de abana, jogando bola, depois criando bigode, depois farreando com uma pretinha? Orgulho que só. E os primeiros passos? Uma beleza!! Mas dá mais trabalho, tanto trabalho. E mais despesa, tanta mais despesa. Ora, é fralda prum lado, roupa que dura mês e pouco tem que comprar outro tamanho, escola de lá, bicicleta de cá. Filho é compromisso. Do brabo. Um dia eu quero, mas num tô pronto, Deus me crie.

Se vem filha então? É vestido todo mês. É boneca que num caba mais. Chora mais que a mãe e aprende a pedir dinheiro mais antes que fazer xixi no pinico da Mônica. Além disso, não por quê tem que querer brinco, tiara, pulseira, colar, tem que querer arrumar o dente e até a chinela de dedo tem que ser de marca da boa. Uai, como é que faz então? Muita trabalheira, muita despesa. 

E tem mais: filho e filha acaba com tua vida privada. Mulher desnua que é bom, só vai é ver na tevê porque a tua que é a direita tá sempre no batente atendendo filho, levando filho, pegando filho, consertando filho que caiu, consertando vaso que caiu. Mas também tem hora que a mulher tá de licença, sem filho nenhum no cangote – mas é justamente aí que o homem tem que pegar no batente de dono de casa. E se o filho dormir, é melhor lavar a louça que ela não lavou e passar a roupa que ela não passou porque tava ocupada cuidando dos piolho da filha ou do joelho esfolhado do filho.

Por isso digo: filho nem pensar. Um dia, mas não hoje em dia.

Filho tem mais: quando cresce da idade de menino menina, dá mais trabalho ainda. Menino em vez de quebrar vidraça, faz menina grávida; Menina em vez de jogar com a boneca, fica grávida.

E eu, cá por cá, não tô pronto pra ter neto. Muito menos para ser avô!

Imagine só: avô! Ser vô custa muito trabalho. E custa muito dinheiro. Neto, quando sabe que o pai e mãe não tem, vem pedir pro vô. E vô tem coração mole e dá pro neto. Eu num tô preparado pra isso não, ainda tenho o coração duro, duro de trabalhar duro, de brigar na rua, de trepar ônibus lotado, de pisar no chão de asfalto quente-frio, de pechinchar toda sexta na feira. 

E o filho, quando num tem pros neto, pede também. E o vô, com coração mole, dá dinheiro pro filho cuidar dos neto. E...

- Adamastor! Tá dormindo, homem? Deixa essa lesera e vem logo conhecer seu primeiro bisneto que acabou de nascer! Tem as suas orelhas.